Entrevista

Eduardo Leite faz balanço do governo e projeta 2024

Governador do Estado falou exclusivamente com o DP sobre os temas que nortearam o primeiro ano do seu segundo mandato à frente do Rio Grande do Sul

Foto: Mauricio Tonetto - Secom - Governador promete diálogo com setores para explicar os decretos para ampliar receitas

Ao completar o primeiro ano de seu segundo mandato como governador do Rio Grande do Sul, o ex-prefeito de Pelotas, Eduardo Leite (PSDB), concedeu uma entrevista exclusiva ao Diário Popular. Na conversa, os desafios enfrentados pelo RS, a rejeição do aumento do ICMS, educação, mudanças climáticas, o desenvolvimento da metade sul e o cenário eleitoral para 2024.

A proposta de aumento do ICMS gerou rejeição da Assembleia, tanto que o projeto foi retirado pelo governo, e já há sinais de resistência aos decretos anunciados como “plano B”. Houve alguma falha na articulação dessa iniciativa? Faltou diálogo com o setor econômico? O que faltou para o projeto avançar?
Faltou voto, simples assim. É um tema sensível, que naturalmente não é simpático. É o que sempre digo, imposto, se fosse simpático, não seria imposto, seria voluntário. A gente impõe o recolhimento para poder devolver à sociedade serviços, investimentos. É um tema áspero, nós fizemos um grande esforço de esclarecimento, mas uma parte dos parlamentares não se sentia em condições de avançar para a votação. E, naturalmente, do lado da oposição, mesmo que nos estados em que governam tenham feito o ajuste das alíquotas, se negam a viabilizar uma votação que alcança recursos ao governo para ele cumprir com sua missão. Foi isso, basicamente. Nós vamos seguir pelo caminho alternativo que nós temos e que está dentro da esfera de competência do governador, que é por decreto promover essa revisão de benefícios fiscais e, assim, viabilizar os recursos necessários não só para mantermos, como ampliarmos os serviços à população. Nós assumimos o governo há cinco anos com salários atrasados, pagamentos atrasados aos hospitais e aos municípios. Estamos pelo terceiro ano completando o 13º salário dos servidores antecipadamente, não há dívidas com municípios, com fornecedores. O Estado tem as contas em ordem, mas para mantermos essas contas em ordem depois de termos perdido parte de nossas receitas em função de uma decisão do Congresso Nacional, quando votou no ano passado as leis complementares 192 e 194, nós alertamos que era importante haver uma recomposição dessa receita através de um pequeno ajuste na alíquota modal. Isso está superado, vamos buscar os outros caminhos que nós temos à mão para manter a arrecadação do Estado e assim poder garantir a prestação dos serviços à sociedade.

A proposta de aumento do ICMS veio após a proposta da reforma tributária que previa o período de 2024 a 2028 como base para a repartição aos estados. Isso não ficou no texto final que foi aprovado, o que torna vago como vai ser esse critério de distribuição.
A reforma mantém a previsão de que a repartição de recursos do futuro IBS se dará considerando a média da participação de cada estado no bolo de arrecadação do ICMS, o que tiraram foi o período de apuração dessa média, jogando isso para lei complementar. Ou seja, diz que tem que ser pela média, vai ter que dizer a média de que período. Não sabemos o que pretendem os deputados a respeito desse assunto. Vamos ter que trabalhar sobre o tema para tentar estabelecer uma média que atenda o interesse dos estados.

Caso os decretos também passem por resistência, qual o caminho que o Estado vai tomar para tentar amenizar os impactos previstos da reforma?
A margem para negociação é estreita e não há nenhuma possibilidade de revogação simplesmente desses decretos. Nós vamos abrir em janeiro a discussão com as entidades, com setores econômicos, vamos estar ao lado de cada um deles. É interesse de todos que os setores econômicos tenham a capacidade para gerar empregos, gerar riqueza, e é interesse de todos, inclusive do setor econômico, que o Estado mantenha a capacidade de fazer estradas, prestar serviços de segurança pública. Ninguém tem interesse que os setores econômicos sofram com uma carga tributária que impeça sua condição de competir e ninguém tem interesse de que o governo não tenha capacidade de sustentar serviços. Vamos sentar e exercer o bom diálogo. Os decretos entram em vigor a partir do início de abril. Nesse período, vamos poder dialogar e identificar que outros fatores que afetam a competitividade dos setores em que o Estado possa ajudá-los a poder competir melhor. Vamos abrir certamente um bom canal de diálogo.

O senhor menciona que as reformas e ajustes feitos no primeiro governo permitiram que o Rio Grande do Sul tenha uma capacidade de investimento melhor. Qual é o cenário atual da economia? Já é possível conjecturar qual é o futuro do Estado a partir dessas mudanças de agora?
A reforma tributária traz uma simplificação do modelo tributário brasileiro, o que vai prestigiar muito a indústria, particularmente. Nós somos um Estado bastante industrializado. Também ao inibir a guerra fiscal no futuro, tende a prestigiar estados que tenham boa infraestrutura, boa formação de capital humano como nós temos. Acredito que a reforma tributária será importante para o Rio Grande do Sul poder ter melhores condições de crescimento econômico. Além disso, a gente trabalha para poder dirigir nossa economia para essa nova economia da tecnologia, da inovação em todas as frentes. Estamos lutando muito para fortalecer nossos ecossistemas de tecnologia no interior do Estado. Pelotas faz parte disso, é um dos polos de inovação que têm recebido muita atenção do governo do Estado, ao lado de Rio Grande. Tem o Pelotas Parque Tecnológico, o Oceantec em Rio Grande. A gente tem trabalhado nos clusters de tecnologia e buscado fortalecer os investimentos do governo do Estado para que a gente possa ter ainda mais relevância nessa nova economia. Claro que o agronegócio e a indústria tradicional são importantes para nossa economia e permanecerão sendo por muito tempo, mas é importante a gente fortalecer e alavancar as áreas mais novas da economia, uma economia criativa e das novas tecnologias. É nisso que a gente está trabalhando para poder dar ao Rio Grande do Sul um horizonte mais promissor na sua economia.

O primeiro governo foi atravessado pela pandemia e pelo desafio de ajustar as contas do Estado. Agora, quais são os desafios do segundo governo?
Sem dúvidas, o que está se apresentando de forma mais crítica agora é a questão das mudanças climáticas. A gente começou o primeiro governo com problemas fiscais profundos, falta de recursos para praticamente tudo. Nós fomos fazendo reformas, organizando o Estado e as contas entraram em ordem. Elas precisam, naturalmente, sempre de um esforço grande para manutenção do equilíbrio, mas as contas estão relativamente ajustadas, especialmente em relação ao que era no passado. A gente enfrentou a pandemia, tivemos um ciclo severo de estiagem, e este ano chuvas intensas, ciclones, vendavais, El Niño, que também tem provocado muitos danos, perdas de vida e impactos da pandemia. Tem sido esse um desafio adicional para o qual a gente tem buscado colocar esforços e recursos para poder reforçar nossa estrutura de defesa civil e também nossa capacidade de resiliência frente a essas mudanças climáticas. Fomos criando novos programas, porque o Estado tendo saúde fiscal, a gente consegue apoiar melhor as famílias que perderam tudo. Criamos o programa Volta por Cima, que destina R$ 2,5 mil para cada família de baixa renda que foi afetada, criamos um programa de transferência de recursos fundo a fundo da Defesa Civil do Estado para a dos municípios. São R$ 110 milhões no total transferidos para os municípios, para ajudar a pagar a reconstrução e reestruturação de estradas, o que for necessário mais urgentemente. Uma série de programas e linhas de crédito com recursos especiais do governo com juros subsidiados para poder ajudar empresas e setor primário a se reerguerem. A gente tem buscado colocar muito esforço para enfrentamento desses efeitos climáticos severos.

Até pouco tempo, quando se falava em mudanças climáticas não se pensava nesses impactos aqui no Rio Grande do Sul especificamente. Esse ano deixou bem claro que as mudanças climáticas chegaram aqui também e o governo anunciou o plano Estratégias para as Ações Climáticas. Qual é o papel que o Rio Grande do Sul pode ter nessa discussão?
É uma agenda que se impõe e a gente tem que trabalhar em diversas frentes. Uma delas, como disse, as de resiliência. As mudanças climáticas estão aí afetando a vida das pessoas, a produção agrícola e também economicamente de várias outras formas. A gente precisa lidar com isso com recursos para reconstrução, para realocação de famílias de áreas de risco. Do outro lado, também dando nossa colaboração ao planeta. As medidas que tomarmos para reduzir emissões de gases de efeito estufa não são aproveitadas por nós diretamente, mas são nossa contribuição ao planeta e que esperamos que todos façam medidas nessa direção. Nós temos um plano de agricultura de baixo carbono que tem várias linhas de ação para incentivar a produção agrícola e pecuária com redução de emissões, entre outros programas de recuperação de nascentes, vamos implementar um programa de pagamento de serviços ambientais em que o Estado vai remunerar proprietários de áreas rurais para recuperação de áreas degradadas ambientalmente. Estamos em fase de contratação de um plano estadual de transição energética justa que vai ser importante, por exemplo, para municípios como Candiota que têm economias muito vinculadas a uma matriz energética poluente e que o mundo começa a rejeitar, então a gente precisa ajudar na transição dessas economias. Temos o ProClima2050, um documento que é roteiro para medidas de mitigação das alterações do clima e temos buscado consultorias renomadas para nos ajudar nos novos programas a serem criados com vistas a essa contribuição do Estado para as mudanças climáticas. É uma agenda que se impõe a todos nós e que vamos trabalhar cada vez mais fortemente.

Outra grande agenda desse segundo governo é a educação. O RS já foi uma referência na área. Recentemente, o presidente da Assembleia apresentou a proposta do Marco Legal da Educação e alguns projetos já foram aprovados. Como melhorar os indicadores do Estado?
É um caminho que não produz efeitos imediatos, mas no médio e longo prazo tenho certeza de que estamos no caminho certo. Nos anos finais, o Estado avançou em comparação dos últimos dois IDEBs da 16ª para a 5ª posição. No Ensino Médio nós saímos da 9ª para a 7ª posição do ranking nacional. A gente tem feito avanços. Uma das razões que puxam o Estado para baixo nesses rankings tem a ver com evasão e reprovação, abandono escolar. Como há uma cultura de reprovação no Estado e um abandono grande de estudantes, a gente tem atuado nessas frentes para melhorar esse fluxo. Criamos os Estudos de Aprendizagem Contínua, um programa que conta com recursos didáticos de apoio e todo um trabalho pedagógico do professor para ampliar as oportunidades de desenvolvimento daquelas deficiências que apurem ao aluno. Para evitar a sua reprovação e melhorar a permanência do jovem em sala de aula que a gente criou o programa Todo Jovem na Escola, que inclusive acaba de ser aprovada a remodelação programática pela Assembleia para reforçar ainda mais os recursos para pagar essas bolsas para permanência dos jovens em sala de aula.

Aliado a isso, temos avançado na expansão do tempo integral, que é uma das nossas estratégias. A gente vai alcançar 205 escolas em 2024. Estamos chegando a 18% das escolas de Ensino Médio em tempo integral na rede estadual, era 1% no governo passado. A nossa meta é chegar até 50%. O volume de investimentos também é grande na infraestrutura escolar. A gente criou o Lição de Casa, programa de obras na educação do Estado. Também tem o Agiliza, em que a gente coloca os recursos direto na mão dos diretores para pequenas intervenções necessárias, desburocratizando. Uma série de ações que o governo está fazendo para poder termos escolas bonitas, arrumadas, métodos de ensino adequados, a permanência do jovem, e com isso uma qualidade de ensino melhor. Eu tenho certeza que a gente vai colher os frutos nos próximos anos.

Em 2024, chega ao fim em Pelotas o ciclo de governo da prefeita Paula, que iniciou ainda na sua gestão, quando ela era vice. Tem acompanhado o processo de escolha do candidato pelo PSDB? Tem algum nome favorito?
Tenho acompanhado, não com especial ênfase por conta das demandas que tenho do Estado e também na pauta nacional, e temos boas opções disponíveis dentro do PSDB, o que é um problema a ser administrado. Seguramente, o deputado Daniel Trzeciak tem uma liderança constituída e um trabalho que o credencia para ser o grande nome nessa disputa, também é absolutamente legítimo que esteja nesse páreo, e que conhece bem a cidade, foi vereador, foi meu secretário municipal, hoje vice-prefeito Idemar Barz. O ex-deputado, hoje secretário de Estado, Luiz Henrique Viana, figura da melhor qualidade e de uma capacidade como ser humano e como gestor público, tenho certeza que tem muito a contribuir. Surge também o Fernando Estima como um nome que não concorreu em outras eleições mas que tem disponibilidade para se apresentar e que tem conhecimento da cidade e trabalhos importantes, inclusive junto ao governo do Estado no nosso Porto de Rio Grande. Tenho certeza de que no momento certo o PSDB saberá encaminhar a decisão sobre qual candidatura melhor poderá representar a continuidade do projeto que tem entregue resultados importantes para a população. Claro que a cidade tem muitas carências, muitas dificuldades, mas acho que tem dado uma contribuição importante ao longo dos últimos anos à melhoria da infraestrutura e da qualidade dos serviços públicos à sociedade pelotense.

Em 2022, o senhor foi pré-candidato à presidência, acabou não disputando, mas é, naturalmente, uma aspiração sua a presidência da República. Tem algum encaminhamento para 2026 ou é muito cedo para falar disso?
É muito cedo ainda porque a gente acabou de passar o último processo eleitoral, tem as eleições municipais pela frente. Como dizia Tancredo Neves, presidência é destino. Depende de circunstâncias, contexto político. Grandes lideranças do PSDB têm declarado ver em mim um nome para 2026, mas sempre conduzi minha vida política com muita tranquilidade e serenidade. Eu não deixei a Prefeitura de Pelotas em 2016 pensando na eleição estadual. O contexto colaborou para que eu pudesse ser candidato a governador e começaram a haver provocações nessa direção a partir de 2017, atendi a esse chamado e aqui estamos, no segundo mandato do governo do Estado. Devemos ter muita tranquilidade de que a dinâmica política pode gerar um ambiente favorável a uma candidatura ou pode pedir um outro caminho. O que me interessa é ajudar o País a superar essa polarização que aí está, em que as pessoas votam no candidato de um dos polos mais porque querem evitar o outro do que porque efetivamente desejam aquele caminho. As últimas eleições demonstraram muito disso. O País segue dividido e a gente precisa trabalhar para promover uma conciliação entre as pessoas, as famílias e nacionalmente para que o País brigue com os problemas, e não fique brigando com as pessoas.

A metade sul, historicamente, tem sido preterida política e economicamente. A sua eleição, sendo um ex-prefeito da região, trouxe esperança de mais protagonismo para a Zona Sul. Qual a visão do Estado hoje para o desenvolvimento da região?
Sem dúvidas, ter um governador que conhece por dentro a metade sul ajuda a poder encaminhar soluções para problemas históricos. Não há um botão em que a gente aperte e resolva todos os problemas da noite para o dia, mas investimentos importantes que o governo do Estado está fazendo é, por exemplo, a duplicação da estrada de Rio Grande. São mais de R$ 50 milhões que estamos investindo. Também o Hospital de Pronto Socorro Regional que estamos construindo em Pelotas em parceria com o Município e que vai mudar muito o panorama da saúde, especialmente no que diz respeito a atendimentos de urgência e emergência. Outras obras de acessos asfálticos, como Amaral Ferrador, que acaba de começar, também encaminhamos soluções para pavimentação do acesso a Pedras Altas. Conhecer essas demandas e ter oportunidade de ajudar em outros projetos para infraestrutura urbana, como a Estrada do Engenho. Estamos lutando para nesses últimos dias do ano poder assinar também o convênio com o município do novo parque às margens do Canal São Gonçalo, que pode ter um investimento de pelo menos R$ 16 milhões para um novo parque naquela área que precisa de recuperação ambiental e que pode ser uma estrutura turística importante. A gente vai fazendo investimento em várias áreas que há muito tempo eram aguardados, por um lado, pela metade sul não estar no centro do poder político, e por outro lado, pela carência de recursos do governo do Estado, faziam com que nós ficássemos para trás em relação às outras regiões.


Nos últimos dias a região foi surpreendida com o aumento nas tarifas de pedágio do polo Pelotas. Embora seja um problema a nível federal, é possível o governo do Estado intervir para tentar conter esse aumento?
É uma concessão federal, não é do governo do Estado. Tenho acompanhado as mobilizações de lideranças locais junto à ANTT para buscar evitar que isso aconteça. Essa concessão deve acabar até 2026, e nós vamos buscar intervir politicamente para evitar um reajuste desse valor que consideramos excessivo.

Para 2024, qual é a expectativa do governo?
As questões climáticas ainda nos preocupam. A gente ainda não tem com precisão qual será o comportamento do clima para os próximos meses, embora haja uma expectativa de manutenção desse El Niño fazendo chover mais ao longo dos próximos meses. Se houver janelas razoáveis de tempo seco, deveremos ter uma boa colheita, então temos uma boa expectativa de safra, especialmente na soja, mas nas outras culturas também. Torcemos para que não tenhamos granizo ou vendavais que prejudiquem a fruticultura e outras produções. Temos uma expectativa de um ano positivo para 2024 no Estado, começando pela questão agrícola, mas também em função de outros investimentos que estamos negociando para o Estado na iniciativa privada, na indústria, que podem ser muito importantes na nossa economia. 2023 já foi um ano de recorde de investimentos através do Fundopem, mais de R$ 2,8 bilhões em investimentos contratados com essa ferramenta a que gente tem no governo do Estado para alavancar investimentos privados. Estou demandando ao Conselho Gestor do Fundopem e à Secretaria de Desenvolvimento Econômico para olhar o que mais podemos fazer para animar esses investimentos em regiões que mais precisam, como é o caso da metade sul. Estou pedindo aperfeiçoamentos da metodologia, das ferramentas do Fundopem, para que a gente possa alcançar de maneira diferenciada benefícios e incentivos para atividades na metade sul.

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